07 julho, 2010

Somos suicidas?


Tragédias como esta enchente que levou de água abaixo as vidas e sonhos dos irmãos alagoanos e pernambucanos deixam alguma lição? Começo a refletir sobre as palavras encharcadas de angústia da prefeita de Branquinhas, no Alagoas. Ao ver que sua cidade foi varrida do mapa, Ana Renata disse que é melhor esquecer a cidade e construir outra longe do rio e dos escombros que a todos impressionam. Imagina ela que esquecida a dor e enterrados os mortos, esta será uma solução para a nova cidade não viver sob o medo da eminência de uma outra tragédia. Mas a sucessão de tragédias que assistimos me leva a retomar a pergunta lá de cima. Estamos aprendendo alguma coisa com tudo isso? Ou continuaremos apenas contando mortos e depois os esquecendo em covas, cavadas às pressas, tão rasas quanto nossas consciências? Logo teremos outra tragédia, e, de olho na bola da vez, ficaremos cegos para as lições que a natureza nos dá. E são lições que custam caro. Custam patrimônios, histórias de vidas, e a própria vida. Todos sabem que construir em cima do chorume é uma loucura, mas o poder público do Rio de Janeiro incentivou a ocupação dos lixões e ofereceu “infraestrutura” para a indignidade se edificar. Quem é que não sabe que desmatar as encostas é burrice pura? Quem é que não sabe que o desmatamento das matas ciliares e que o avanço da cidade sobre rios e igarapés é um convite a tragédias desse tipo? Mas vai-se se fazendo vista grossa. Melhor isso do que um programa realmente sério de moradia popular, isso custa caro. Acontece que poucos, muito poucos estão realmente preocupados com a natureza. Até ela bater em nossa porta com a força de uma enchente. Com a fúria de um deslizamento de terra. Até ela entregar a fatura do descaso com o meio ambiente. Pensamos quadrado. Não aprendemos ainda que a terra é redonda. Que nela uma ação é conseqüência de outra . Que tudo é continuidade. Causa e efeito. E continuamos a repetir os mesmos erros. Cultivando as mesmas práticas ancestrais. Esquecendo que hoje não temos meia dúzia de gatos pingados nômades passeando por um planeta onde nada parecia ter fim. Éramos livres para não pensar no amanhã, no outro, no planeta. Nossa inconseqüência não nos atingia. Agora isso mudou. Mas não mudamos. Ainda não. A reciclagem de lixo é pífia. Continuamos a desperdiçar recursos naturais e a pressionar cada vez mais a natureza. Coleta seletiva é programa sério de algum prefeito desse Brasil? Vamos além: quantos governantes por esse mundo, presidentes, governadores, prefeitos estão pensando, não na futura eleição, mas num modelo de gestão que respeite a vida? Por aqui usamos a justificativa de que os gringos já desmataram tudo, mas nós ainda não atingimos a nossa cota. Cota de quê meu Deus! De burrice? E vamos queimando a floresta, desmatando as encostas, a mata ciliar . Vamos ocupando as margens do rio, como os nômades faziam. Mas não somos nômades. O que somos então? Suícidas?

Crônica de Rudney Prado

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